16 de fev. de 2017

Flexibilização da jornada de trabalho no IFPR: política institucional ou privilégio individual?


Comentários críticos a respeito da Resolução CONSUP IFPR n.10/2017



Antes de tudo, um esclarecimento burocrático singular. A inciativa e a proposta de se dispor comentários a respeito sobre uma resolução institucional do IFPR tem como objetivo, tão somente, de contribuir com o desenvolvimento e as melhorias legais e práticas da operacionalização do próprio IFPR. Esta é a base e a natureza primeira e última de tudo o que aqui se argumentará. Se personalidades e indivíduos se sentirem ofendidos ou desprestigiados, peço-lhes um pouco de silêncio meditativo e coerência social: estamos, todos nós, sob a responsabilidade de ofertar e aperfeiçoar serviços primários à sociedade e devemos, em tudo e para tudo, praticarmos a boa e essencial fórmula da discussão pública: comum (entre todos), aberta (para todos), franca, justa (imprescindível), respeitosa, certa (objetiva) e, por que não?, gostosa. Dito isso, evoluamos. Não há qualquer ofensa individualista, nem gotas de insubordinação, ciúmes ou dores de cotovelos. A ideia é aperfeiçoar os conceitos (mentais) e a própria administração do IFPR, sem que isto seja ofensivo, in nature.


O histórico de um processo de implementação de jornada de trabalho flexibilizada para os TAEs do IFPR é longo, tendo início mesmo na própria origem institucional, no ano de 2009. E, apesar disso, ainda se mantém como um tema imaturo institucionalmente (entre a comunidade) e, mesmo com a Resolução (ou sobretudo através dela), incompreendido (talvez, mais que incompreendido, ineficiente e motivado por interesses políticos restritivos). Esta é a síntese do que aqui se vai argumentar. Infelizmente, e por questão de economia, não será abordado todo o histórico e as diversas normas (Portarias e Resoluções) e trabalhos (estudos de GTs) já dispostos, revogados ou esquecidos, etc. Trataremos apenas do que recentemente se aprovou no CONSUP e das concepções (de instituto e de organização de trabalho) e formas dadas e apontadas pela Resolução.

A imaturidade institucional sobre o tema é explicada pelas diversas opiniões, interpretações e fórmulas dadas por cada um, cada local ou cada grupo, mas não só: ela salta à vista quando se expõem como uma “conquista” sólida e coerente, como se estivesse pronta a política institucional da flexibilização da jornada de trabalho dos TAEs. Isso, até aqui, sempre durou tão pouco quanto a estabilidade da gestão maior do IFPR através da Reitoria. Em outras palavras, durou enquanto se manteve aquele que presidia o CONSUP; alterado o Reitor, ruída a “conquista”. E o fato de uma nova normativa, desta vez em Resolução, surgir sem que tenha absorvido, anteriormente, as difusas opiniões, sugestões, esclarecimentos de todos aqueles que querem ou sentem o direito de participar, demonstra, a priori, que de conquista pode-se ter apenas a fumaça.
Por consequência, a incompreensão normativa é mais do que mera interpretação de suas disposições e é a própria fórmula da regulamentação da flexibilização: e não se fala apenas nos autores, mas no próprio colegiado que constitui o CONSUP e, portanto, de modo genérico, toda a coletividade institucional, pelo menos de modo representativo. Em outras palavras, parece bom e justo, o fato de existir a regulamentação, e parece que isso já basta. Mas torná-la exequível e compreender sua fundamentação, político-administrativa, é um imbróglio. E isso se justifica, através da Resolução CONSUP n.10/2017, por diversos pontos que serão abordados neste documento. Antes, porém, é necessário que se afirme o que é e para que se deve a implementação da jornada flexibilizada de trabalho para os TAEs, o que nos traz dois pontos fundamentais:

          1- Luta por justiça social e conquista de uma luta histórica do trabalhador por melhores condições laborais e de vida: a flexibilização da jornada de trabalho é uma conquista histórica do trabalhador, que sempre lutou pela redução da jornada de trabalho e por melhores condições de trabalho. Dentre uma infinidade de (sub)argumentos, cita-se: saúde e qualidade de vida do trabalhador, maior produtividade e qualidade dos trabalhos desenvolvidos, etc.

            2- Política Institucional de Gestão: a flexibilização da jornada de trabalho é, em par com a anterior, uma política institucional voltada pelo aprimoramento da instituição com a oferta de serviços mais eficientes, com melhor qualidade nos serviços e no gerenciamento das atividades institucionais, (maior) transparência, etc.

Em ambos os casos, existem uma série de estudos que comprovam a argumentação (e que poderiam ser desenvolvidos aqui; mas, em razão de não estendermos muito, limitamos ao essencial, a ideia). O importante aqui é ter estes elementos como o foco embrionário da discussão de uma política de implementação da flexibilização da jornada de trabalho para os TAEs, ou, em outras palavras, o seu objetivo maior. Deve(ria)-se, assim, evitar a discussão da flexibilização da jornada a partir da lei e do que diz suas variadas interpretações, ou de outras instituições, sejam irmãs ou “controladoras”. O embrião, a gênese, é a qualidade do trabalho institucional, na prestação do serviço e em seu gerenciamento, na justiça social e na saúde e qualidade de vida do trabalhador. A lei é o meio para se chegar a esta finalidade e ela já o permite (para o IFPR) e está estabelecida (não de forma satisfatória, mas já possível!). Aqui, no IFPR, no entanto, as finalidades tornam-se confusas; as interpretações são difusas e dispersas; e as ações, de intencionalidades o mais restritas e restritivas. É isso que faz culminar em uma resolução como esta última, Res. CONSUP n.10/2017. 
 
Primeiro, cabe a consideração do porque uma resolução do CONSUP e não tão somente uma Portaria do reitor, já que a legislação menciona “dirigente máximo”. Ora, considerando que “a administração dos Institutos Federais terá como órgãos superiores o Colégio de Dirigentes e o Conselho Superior” (art. 10º lei 11.892/08), onde este último, e apenas ele, é deliberativo, conclui-se que o CONSUP é quem tem o papel e a responsabilidade de normatizar suas políticas institucionais (recordemos sempre, ainda, que os IFs são autarquias, que possuem autonomias administrativa e financeira), formando as diretrizes para a Administração rodar. Além disso, portarias de reitor são ferramentas de execução de um exercício eleitoral, em um mandato temporal. Podem ser ações de políticas justas e certas, mas certamente são (mais) frágeis (para este caso) e passíveis de contestação e reversão também monocrática, sem maiores debates e decisões coletivas, considerações chaves para a constituição de um Conselho Superior em autarquias como a nossa. (Esta questão pode, talvez, gerar alguma controvérsia, mas vem daí a admissibilidade da flexibilização da jornada como uma política institucional, o que, em tese, deve ser deliberado pelo CONSUP, cabendo ao reitor – e Diretores Gerais – o papel executor das determinações feitas pelo colegiado. É certo, porém, que o decreto n.º 1590/95 faculta “ao dirigente máximo do órgão” (dirigente, não gestor, como quer a resolução!) e, ainda mais correto, é uma instituição como a nossa defender, para além de um e outro gestor, suas políticas internas preservando e fortalecendo sua autonomia e sua organização democrática: ou seja, direcionando suas políticas de administração a partir das discussões e decisões colegiadas.)

Neste sentido, portanto, a normativa dada agora no IFPR é correta, enquanto uma Resolução do CONSUP, porém, ironia dos versos, a “conquista” do que se enseje com esta resolução é logo diluída no corpo da própria. E isso já a partir de sua ementa, quando diz “recomenda” ao Reitor, ao invés de afirmar, determinar a possibilidade de, como haveria de ser uma política institucional. Ou seja, o que poderia (deveria) ser uma resolução para o todo, tornou-se uma recomendação para o ‘um’; deixou de resolver. O que poderia (deveria) ser uma política institucional de gestão de pessoas, permitindo e possibilitando a flexibilização da jornada de trabalho para aos TAEs, foi recomendado como um arbítrio, ao aceite ou ao veto, do reitor. Segundo certos preceitos regulamentares, é verdade, mas, como veremos agora, preceitos todos centralizados no poder ubíquo da executoriedade do reitor. Em outras palavras, as deliberações institucionais do CONSUP determinaram (muito além de uma recomendação), neste caso, poder total à pessoa do reitor.

A resolução, portanto, foge de si mesma desde a origem, se consideramos que o tema da flexibilização possui a fundamentação acima apontada: justiça social, melhoria nas condições de trabalho, na prestação do serviço e para a saúde (ampla) do servidor. Ela, a flexibilização, deixa de ser uma política institucional e é direcionada, pela resolução do CONSUP, a uma “gratitude” individual, uma “conquista”. Nada mais explícito disso que vincular a flexibilização em uma Portaria única, individual, personalíssima (parágrafo único do artigo 17º). Mas passemos a argumentar onde ela se perde, e como ela inverte o que seria uma conquista (política institucional) e uma melhoria (laboral e prestação de serviços).

1) Funcionamento contínuo de doze horas ou mais: os horários de funcionamento da instituição são considerados a partir da Resolução da flexibilização da jornada de trabalho dos TAEs. Mas não há nenhuma determinação, senão apenas uma delegação de atribuição. Assim, caberá ao Reitor definir o(s) horário(s) da Reitoria e aos Diretores Gerais, dos Campi. Ou seja, a resolução não resolve, nem recomenda: deixa que os reitores e os diretores gerais determinem seus horários (pois poderão ser diversos!) e, por sorte, qualifiquem/desqualifiquem qualquer discussão para a flexibilização da jornada de trabalho por este viés. O que demonstra a “natureza” desta resolução, na vontade (mesma) de se criar empecilhos burocráticos administrativos. Ora, se a resolução fosse fruto, conclusão de algo bem gestionado institucionalmente, seu ponto de partida seria já determinar os horários de funcionamento da instituição, ou pelo menos que as atribuísse aos colegiados responsáveis pelas deliberações em cada unidade administrativa, e em acordo com os planejamentos e resoluções nestes locais estabelecidos. Ao não fazê-lo e, pior, ao delegar para cada gestor das unidades administrativas, a própria Administração (CONSUP/Reitoria) demonstra sua “confusão” administrativa: não existe, desde logo, um planejamento e um reconhecimento dos próprios serviços ofertados pelo Paraná afora, em mais de vinte unidades administrativas. No entanto, também existe a possibilidade de se omitir, do tema da flexibilidade, a essência de uma política pública e institucional, transformando-a em nada menos que maiores poderes às vontades das chefias.
Portanto, a definição primeira do horário de funcionamento da instituição a não-resolução não-recomenda, mas apenas atribui a delegação para uma decisão monocrática (contrária à própria natureza da instituição e de seus regulamentos maiores!), e isso sem dispor qualquer critério ou embasamento para a decisão. Num universo (político) de otimismo, é justamente o fator do horário de funcionamento, estabelecido para doze horas diárias, como mínimo, para a Reitoria e para todos os campi, que possibilitaria a flexibilização da jornada de trabalho. Mas isso é para um universo otimista, onde a política é um campo de forças equilibradas, pautadas por argumentos que desenvolvem o próprio amadurecimento e a evolução em direção a melhorias e aperfeiçoamentos público-institucionais. Aqui, como se vê, isso faltou/falta. Pode não ser intencional, mas é característico.

2) Setor: a resolução busca delimitar a menor caixinha no organograma institucional como uma entidade própria e específica, quase autônoma, como uma autarquia para efeito da flexibilização, portanto, da gestão de pessoas. Difere, por exemplo, do que deveria ser compreendido pelo Regimento Geral (uma estrutura organizacional que define a integração e a articulação dos diversos órgãos situados em cada nível”). O que significaria dizer que, apesar dos níveis, existe uma estrutura organizacional integrada e articulada, conjunta, co-responsável, una. Mas há, também (ou igual – nossas normativas são lindas!) o parágrafo único do artigo 25º e o artigo 26º:

Parágrafo Único. A administração do IFPR, apoiada pelos seus órgãos colegiados, é realizada pela Reitoria e pela Direção Geral dos Câmpus, por meio de uma estrutura organizacional que define a integração e a articulação dos diversos órgãos situados em cada nível.
Art. 26. A gestão de forma colegiada estabelecerá as diretrizes sistêmicas que serão seguidas por todas as unidades, por meio de seus atos normativos e das resoluções e deliberações dos fóruns colegiados

Ora, segundo o Regimento Geral, a Administração, que envolve, além de tudo, uma determinação e verificação de volume de trabalho e força laboral, é realizada pela Reitoria e pelos Campi. Contrário, no entanto, ao Regimento, a Resolução decide restringir, delimitar, espremer a Administração em pequenos quadradinhos setoriais, solicitando dos servidores que justifiquem a necessidade de se fazer a flexibilização. Posto que a questão da flexibilização não se trata de um privilégio ao indivíduo (de modo contrário, vai pro espaço a coisa pública), é de se questionar como a resolução quer a eficiência, a razoabilidade, a proporcionalidade, a motivação, a finalidade (institucional)… se confronta ou antagoniza com o próprio regimento geral da instituição, como? Ou seja, o fim é o serviço que a instituição oferta ou a carga horária do indivíduo-servidor?
A questão do setor e menor unidade administrativa sugere duas motivações: 1) restringir ao mínimo o que a legislação possibilita, a flexibilização; 2) tirar a responsabilidade daqueles que devem ser os gestores, responsáveis, pelo planejamento (comunitário) e adequação da força de trabalho. Fica sugerido algo do tipo: “Para fins de CDs e FGs, me valho do cargo; no que diz respeito à questão da adequação de força de trabalho, qualidade de serviço e responsabilidade ‘setorial’, aí é o servidor lá em baixo quem deve assinar (vide anexos da resolução)”.

3) Comissão, Comissões, Fluxograma processual: aqui a Resolução deveria esconder um pouco suas vergonhas. Cria-se uma supercomissão (três membros para cada unidade administrativa) para o acompanhamento da jornada flexibilizada, que, mais do que acompanhamento (desnecessário em uma administração já consolidada ou com políticas de gestão de pessoa e de avaliação da qualidade de seus serviços), é a própria julgadora para a jornada flexibilizada, entre outras atribuições completamente desbaratadas. A questão é, ao que sugere, que a flexibilização é praticamente inviável, sob qualquer ponto de vista, mas é possível. Para tanto, o servidor terá que superar (a resolução e seus obstáculos), justificar (sua pretensão), relatar (como vê seu trabalho), especificar (como entende suas atividades), enfim, o servidor deverá se esforçar (burocraticamente) tanto, que a sua visão institucional terá que ser convincente com o que quer a chefia, a comissão (nomeada pela chefia!), a reitoria (nova comissão, não ad hoc!), etc. Tudo, menos o que diz o Estatuto, os Regimentos, o Manual de Competências, etc. e o que caracteriza e determina a própria institucionalidade. Afinal, as chefias (CDs e FGs) são nomeações do Reitor e dos Diretores Gerais, assim como a Supercomissão, com membros “indicados pelos respectivos gestores” (notem a ironia: gestor! De decisões monocráticas e escolhas pessoais?). E a supercomissão fará todo um trabalho que, imagina-se, deveria ser atribuição de setores administrativos já implantados e em funcionamento: ou não se faz e nunca se fez, até então e sem esta comissão, gestão de pessoas, avaliação de serviços e planejamento?
O fluxo processual é a fórmula… A abertura do processo se dá pela chefia imediata (nomeação do DG), que deve justificar a necessidade de flexibilização, tendo os servidores que assinarem a responsabilização pela mesma. O processo é encaminhado para a Comissão (nomeada pelo DG) que “favorecerá” ou não a flexibilização (no setor e dos servidores) e encaminhará para o próprio DG fazer uma análise. Imagine ele discordar daquilo que servidores nomeados por ele, em confiança (chefias e membros da comissão)… mas pode acontecer. Neste caso, o DG deverá recorrer e justificar. Daí, vai para a reitoria e a comissão de lá. Se tudo deu “favorável”, farão uma minuta de portaria e o reitor assinará, individualmente, cada autorização (pessoal) para a flexibilização. Se chegou nas mãos da comissão permanente (sic!) da reitoria um parecer “desfavorável” do DG, onde este recorre com justificativas… bem, aí a Resolução não define nada. Talvez a comissão permanente apenas defira o desfavorecimento, porque ninguém é tão otimista para crer que a comissão permanente vá contrariar ao DG. Ou pode? Nem se sabe se é possível, posto que a Resolução não especifica. E esta é a política institucional para flexibilização.
Muito interessante para as considerações e argumentações vindouras é o Relatório de Auditoria fornecido pela CGU (Relatório nº: 201601464), de onde, inclusive, a “PROGEPE” se embasa para a defesa da Resolução em questão. Diz este relatório, em sua página três:

2.2 Avaliação da Gestão de Pessoas
Entre 2012 e 2016 (fevereiro) o IFPR teve um expressivo aumento no seu quadro de pessoal, sendo 1.094 docentes em 2016 ante 507 em 2012 e 877 técnicos administrativos em educação em 2016 ante 345 em 2012.
Apesar da relevância do capital humano na instituição, ainda se encontram pendentes de implementação políticas de gestão e governança em RH, tais como:
- metodologia de avaliação da qualidade/quantidade dos serviços prestados pelos servidores;
- indicadores de gestão na área de pessoal;
- política de incentivo e motivação de servidores;
- avaliação da qualidade da produção técnica/tecnológica dos docentes e
- entre outras políticas.

Pareceria, portanto, que a Resolução CONSUP n.º10/2017, e as Comissões que se determina, visaria, justamente, a implementação de políticas de gestão e governança em RH, sobretudo no que se refere à avaliação de qualidade/quantidade de serviço e indicadores de gestão. Está resolvido!

4) Autarquia, Autonomia administrativa, Autonomia universitária: a instituição na defesa de seus atos, propostas, políticas… esse é um extra para o debate, necessário de se considerar, sobretudo frente àqueles argumentos que visam o medo e a quietude quando a CGU, TCU e outros dedicam sugestões administrativas para o IFPR.


Servidores TAEs do IFPR, uni-vos!




Instituto Federal do Paraná, fevereiro de 2017.